‘Se o Brasil não enfrentar o problema fiscal, a crise vai voltar’, afirma Marcos Lisboa 182i5y

478 0

Para economista e presidente do Insper, fraqueza da economia neste início de ano é um reflexo da interrupção da reformas; G1 publica série de entrevistas sobre ‘Desafios do Crescimento’. O Brasil tem um caminho difícil pela frente e sem margem de manobra para fugir da agenda de reformas, afirma o economista e presidente do Insper, Marcos Lisboa. Na avaliação dele, se o país não resolver a questão fiscal, é provável que a economia brasileira sofra com uma crise econômica pior do que a enfrentada nos últimos anos.
“Se o Brasil não enfrentar o problema fiscal, vamos nos preparar porque a crise vai voltar talvez mais severa do que já foi”, disse.
Marcos Lisboa
Marcelo Brandt/G1
A fraqueza da economia neste início de 2018, segundo o economista, já é um reflexo da paralisia do governo, que deixou a agenda de reformas de lado desde meados do ano ado.
“Não fazer nada hoje é condenar o país a ficar pior”, disse Lisboa, que foi secretário de política econômica durante o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Ilustração: Alexandre Mauro/G1 O G1 começa a publicar nesta sexta-feira (18) uma série de entrevistas com economistas para debater o atual estágio da economia e os caminhos para a retomada do crescimento. Na próxima semana, o entrevistado será o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal. A seguir os principais trechos da entrevista concedida ao G1. Entrevista com Marcos Lisboa A economia neste início de ano parece travada. Houve um excesso de otimismo com a expectativa de recuperação? O Brasil tem problemas graves. A interrupção da recessão veio quando o país sinalizou que estava começando a discutir com menos incompetência e mais seriedade os problemas. No fim de 2016, tentamos começar essa agenda (de reformas). E aí deu-se o benefício da dúvida para o país e a economia parou de piorar. Mas os problemas não desapareceram. Não fazer nada hoje é condenar o país a ficar pior. Quais são as reformas prioritárias? São várias. A Previdência é urgente. É inacreditável o país não ter feito essa reforma há 20 anos. Mas não é só a Previdência. Há essa profusão de programas sociais, alguns funcionam muito bem, como o Bolsa Família, outros são ineficazes, não têm avaliação. Também o nosso fracasso em educação. O Brasil aumentou o gasto com educação para 6% do PIB e os nossos resultados são lamentáveis quando comparados com países emergentes que gastam menos. Não é pouca coisa a ser feita. O problema imediato para se enfrentar é o fiscal. E se não enfrentar, vamos nos preparar porque a crise vai voltar talvez mais severa do que já foi. O investimento também dá sinais de fraqueza. O que está impedindo a melhora? A estrutura tributária do Brasil é completamente disfuncional. Como eu vou investir no Brasil se eu não sei qual vai ser a estrutura tributária daqui a um ano? Eu não sei a regra do jogo, a estrutura tributária muda dia sim, dia não. Tem empresas no Brasil que recebem duas, três notificações de medidas tributárias por dia. O economista Marcos Lisboa, em entrevista ao G1 Marcelo Brandt/G1 Então não adianta baixar juros e achar que o investimento vai voltar? Baixa juros é bacana, acho ótimo. A inflação caiu, mérito do Banco Central. Agora, não dá para imaginar que o país vai iniciar uma trajetória de crescimento sustentável, aumentando a capacidade produtiva, com o grau de incerteza que nós temos. Vai que o Brasil continua irresponsável e não faz reforma da Previdência? Aí é melhor ir embora. O investimento aposta no Brasil no curto prazo, mas o investimento em fábricas grandes é feito em um lugar em que se conheça as regras do jogo nos próximos 10, 20 anos. A previsão é que o Brasil só volte a ter superávit em 2022. Como todo esse quadro se ajusta a isso? Se não fizer reforma, não vai voltar a ter superávit em 2022. Vai ter que mexer em previdência, vai ter que fazer a reforma do Estado, vai ter que mexer em vários programas ineficazes. Aumentar imposto também? Vai ter que aumentar imposto também. E vai ter que reduzir as distorções tributárias. Tem todo um ajuste para fazer que é imenso. A gente não chegou na situação que está por ter feito pouca bobagem. As reformas ficaram para o próximo presidente agora. O que esperar? Pois é, mas o país vai ficar pior. E isso ocorre por duas razões: internamente, o país piora porque o caso é grave. E segundo: os Estados Unidos estão crescendo forte há três trimestres. Em algum momento a taxa de juros vai subir lá. Se o Brasil interrompe a agenda de reformas e o cenário muda lá fora, o país vai colher no ano que vem a inação de agora. Ou fazemos reformas ou vai ficar pior. Marcos Lisboa Marcelo Brandt/G1 Qual é o prazo que o governo tem para fazer essas mudanças e conseguir dar fôlego à economia? A nossa janela de oportunidade para evitar a volta da crise está se esgotando. São reformas duras, difíceis. A reforma da Previdência dos servidores públicos é urgente e houve uma resistência das corporações que estão na elite dos trabalhadores a rever benefícios que não são sustentáveis. Estamos vendo como esse debate é difícil no Brasil. No setor privado, as desonerações fracassaram. Ficou clara a dificuldade que foi começar a retirar a distorção que era a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), com resistência do setor privado, governadores, vários políticos. A disputa entre o Brasil velho e o Brasil novo está sofrida. Todo dia é uma disputa de medidas protecionistas, para conceder mais distorções, mais proteções para grupos de interesse do setor público e setor privado. O Brasil é tomado desses pedágios que a sociedade paga no dia a dia, que são destinados a interesses públicos e privados, sem avaliação de desempenho. O cobertor está curto para lidar com tantos interesses? Acho que é mais do que o cobertor curto. O dinheiro acabou. O país está precisando discutir essa impressionante quantidade de pedágios que paga sem saber muito bem para quem. Por que o Brasil ainda tem esse regime cartorial? Faz sentido ter o sistema de cartórios que o Brasil tem? A gente não pode reclamar do fato de o Brasil ser um país caro. Toda vez que você vai comprar alguma coisa você está dando muito dinheiro para vários grupos de interesse. E é possível resolver isso ou o Brasil já perdeu essa briga? Agora pelo menos tem um Brasil novo disputando a briga. Era muito pior no ado. Eu acho que a boa notícia é que tem uma clareza de agenda para reduzir esses imensos pedágios que o Brasil paga, colocar as contas públicas em ordem, saber que vamos ter de rever o regime dos servidores públicos ou os Estados e municípios vão quebrar. O estado brasileiro prometeu o que não tem condições de entregar. Mas se a gente consegue enfrentar essa agenda, a boa notícia é que tem muita coisa bacana para fazer. O Brasil tem um imenso potencial para crescer. A gente não cresce mais por incompetência nossa. A discussão eleitoral está olhando para os problemas centrais? Isso me preocupa. Estamos vendo palavras de ordem que nem de longe arranham os problemas do país. Qual é a proposta da reforma da Previdência, como é que vai enfrentar a crise dos Estados, qual é a proposta para segurança? O que a gente assiste hoje são palavras de ordem. Eu fico surpreso de ver uma garotada que defende fechar o museu. Não quer ir ao museu, não vai. Esse aspecto do debate vale para os dois lados e é preocupante, sem o detalhamento dos problemas reais e graves que o país tem. O economista Marcos Lisboa concede entrevista ao G1 Marcelo Brandt/G1 5og5o